Ah, como é bom conhecer o mundo!
Voltei há pouco tempo de viagem, essa que na verdade estava programada para o começo de 2020, mas teve que ser adiada por quase longos três anos por conta da pandemia.
E mesmo com toda essa demora e longa espera, meu sonho de conhecer e estudar nesse lugar não mudou em momento algum. Foi libertador voltar à vida normal.
Por que ir ao Vietnã?
O Vietnã geralmente não é a primeira escolha das pessoas quando estão procurando um lugar para viajar. Mas foi a minha escolha, até porque tem tudo a ver comigo e com o que eu amo.
O Vietnã é o segundo maior produtor de cafés, do tipo robusta, do mundo. E além deste, eles também estão investindo pesadamente na produção de café arábica orgânico.
Por isso minha viagem não poderia ter outro motivo. Fui aprender na prática, como funcionam os processos, que vão desde os cuidados básicos no plantio, a colheita, fermentação, secagem, armazenamento, classificação e a degustação, que foi o meu maior objetivo nesta viagem.
Cafezais do Vietnã
Durante meu tempo lá, minha rotina era acordar muito cedo e ir para a fazenda na garupa de uma moto, andando pelas estradas de terra molhada já que lá chove todos os dias, às vezes fazendo frio ou calor.
E acompanhar essas etapas da rotina dos produtores também foi um desafio transformador. Mesmo que tenha encontrado algumas dificuldades no meio do caminho, eu estava feliz!
Se me perguntassem o que senti quando coloquei meus olhos em um pé de café carregado de cerejas maduras, eu não saberia o que responder.
A fazenda na qual fiquei para meu treinamento, fica na região de Da Lat, e se chama Son Pacamara. E esse lugar tem todas as condições climáticas e biológicas perfeitas que seriam necessárias para criar um ecossistema saudável do café arábica orgânico que eles vem produzindo.
Todo o seu processo de plantação é diferenciado, focando na saúde das árvores e na produção de qualidade. Incluindo o fato de que eles usam apenas fertilizantes ou pesticidas biológicos quando necessário, já que para eles, apenas as árvores mais saudáveis vão produzir os café de maior qualidade.
Qual o processo de seleção do café Arábica na Son Pacamara?
Depois que as cerejas do café crescem, elas passam por um processo de seleção dos melhores grãos seguindo alguns passos.
O primeiro deles é a seleção a dedo das cerejas, apenas as que possuem níveis de açúcar acima de 16% acabam passando nesse processo. Antes que elas sejam descascadas, todas as cerejas são lavadas e possuem seus defeitos removidos.
Elas são fermentadas e tem seu PF checado de 3 em 3 dias, além de ficarem secando em ambientes especiais para que não fiquem com nenhum cheiro e até que atinjam um ponto de umidade específico para armazenamento.
E o penúltimo passo consiste em separar os tamanhos e remover outros defeitos dos grãos antes de torra-los. E por último é feita a última revisão dos defeitos antes que ele seja comercializado. São vários processos e etapas seguidas rigorosamente, até que esses grãos cheguem até nós.
Muito mais por trás de uma viagem…
Mas a minha vontade e sonho de ir ao Vietnã vem de muito tempo atrás….
Desde que comecei minha trajetória com o meu curso, o objetivo era ensinar meus alunos a trabalharem com o café, ensinado na prática o uso de produtos, equipamentos e preparo de bebidas.
Sempre falei também sobre a importância de testarem novos sabores e aromas, se aventurar no mundo da cafeína. E mesmo que meu curso seja um sucesso após 16 anos, continuo seguindo com muita transparência dentro e fora da sala de aula.
Por isso, quando me perguntavam se eu sou degustadora, a resposta sempre foi: não! Pelo simples fato de não ser. E acredite: ainda fui criticada por gente que nem conheço, por falar a verdade.
Conheço profissionais da área, degustadores renomados que já compartilharam suas histórias comigo e estamos sempre nos encontrando em eventos de cafés mundo afora. Jamais colocaria tudo o que eu construí em risco, pela falta de verdade naquilo que eu realmente sou.
Entendam: sem sempre um barista será um degustador, porque necessita ter um bom paladar e memória, mas normalmente quem é um degustador, automaticamente torna-se um barista.
O degustador vai apenas provar o café e pronto? Não! O trabalho dele vai muito além disso.
Ele é o profissional que vai determinar a classificação do material, ou seja do café, e sua qualidade através dos seus sentidos, a visão, olfato, paladar, tato e audição. É uma prática que leva tempo e aperfeiçoamento da pessoa que quer seguir nesse ramo.
Eles precisam fazer provas profissionais de café, que envolvem laudos e avaliações técnicas rigorosas, além de treinamentos diários para que um dia possam ser qualificados para tal função.
E esse processo de se tornar um degustador não ocorre apenas uma vez, já que de tempos em tempos esse profissional vai ter que passar por um sistema de avaliação mundial. Uma reavaliação, chamada Calibragem, para saber se eles ainda estão aptos a possuírem sua certificação de que são qualificados.
A prova de calibragem é destinada aos degustadores que precisam sempre ter seus sentidos afiados e a qualidade em dia. Portanto, nessa prova eles são testados de forma periódica para saber que podem analisar os sabores, texturas e cheiros com as suas melhores ferramentas.
Um profissional que passou pela prova de calibragem deve identificar os níveis de qualidade de lotes de café, sejam exportáveis ou não, identificar um café especial, descrever o perfil de cada xícara e muito mais.
Mas tudo tem um início
E não me denominar degustadora, não significa que nos meus anos de experiência não estivesse estudando.
Muito pelo contrário, na verdade, venho participando de diversos treinamentos, ao longo dos últimos três anos e depois de tanto tempo me senti preparada para, enfim, fazer essa viagem e ser avaliada por um profissional competente da área. Passei por algumas fazendas de café e eu tive o melhor professor de degustação que eu poderia ter escolhido.
Son é um profissional com 40 anos de experiência na degustação e apaixonado pelo que faz. Eu vi o brilho nos olhos o tempo todo, a paixão pelo que faz é nítida. Entre uma aula e outra, me questionava para saber até que ponto eu realmente estava acompanhando.
Segundo ele, no mundo da degustação, eu apenas comecei e sabemos que é um caminho sem volta, com muito estudo, muita prova e um desafio diário. E posso falar com toda certeza de que ele estava certo, quando você treina o olfato e o paladar, automaticamente passa a trazer para a sua vida todos os cheiros e sabores à sua volta que pareciam estar adormecidos,
Voltei para casa com uma gratidão enorme por tudo, pelo treinamento, pelas pessoas que conheci e pelos lugares lindos que pude ver.
Meu turismo no Vietnã
Meu treinamento na fazenda começava bem cedo e terminava por volta das 17h, então não sobrava muito tempo para conhecer os pontos turísticos da região.
Mas uma das grandes vantagens de viajar sozinha é poder organizar os horários e locais que vamos visitar, sem perder tempo. E foi isso que eu fiz, me programei para conhecer em apenas 1 dia, alguns lugares em Da Lat. Darei um pequeno spoiler e acreditem, tudo que eu vou te contar, vale muito à pena.
Crazy House
A Crazy House ou Casa Maluca foi um ponto turístico que me surpreendeu de cara! Tinha colocado no itinerário mas nem imaginava a grandiosidade do lugar! Tão linda, tão exuberante, tão encantadora e quando você começa o tour vão surgindo mais detalhes interessantes, mais curvas, mais portas, mais escadas para cima e para baixo – e haja pernas! – e você tem a sensação que está sendo engolida pela casa.
Pesquisando, descobri que o lugar não é apenas para visitação, é um hotel também, já que conta com 10 quartos de diferentes temáticas e decorações. Imagine só, acordar num lugar que parece ter saído de um livro de contos de fadas.
Olhando de fora, a casa parece ser feita de madeira, mas é apenas parte de seu design porque na verdade ela é feita de alvenaria. Inclusive, o seu design foi projetado por Dang Viet Nga, filha de um ex governante do Vietnã que estudou arquitetura.
A ideia de sua aparência surgiu do entorno, Dang quis seguir os arredores da pequena vila que tem em volta. Então em 1990 a casa de cinco andares foi construída.
Hoje em dia Dang Viet Nga, conta que a casa é a representação de sua vida e imaginação, está tudo em uma estrutura só. Outro ponto muito interessante sobre a Crazy House, foi que Dang não usou nenhuma planta para a construção, apenas pinturas de como ela pensava que ficaria.
Apesar da casa ter sido construída muitos anos atrás, ela não pretende dar esse projeto como finalizado, Dang está sempre atualizando a casa e adicionando mais construções.
O diferencial é que o tour é livre, mas se você precisar de ajuda ou quiser saber alguma informação sobre a casa, pode perguntar para alguém que faz parte do gentil staff, que aliás, estão ali sempre prontos a ate dar informações, suporte ou tirar as suas fotos. Vídeo aqui.
Stairway to Heaven
Essa talvez seja uma das atrações que mais deu trabalho para encontrar, já que fica localizado no jardim de um restaurante e não é muito divulgado na região. Nem o taxista sabia que existia, mas graças as redes sociais conseguimos acha-la.
A Stairway to Heaven, ou escadas para o paraíso, são literalmente escadas que vão subindo para o céu e param no meio do caminho. Chamou tanta a atenção que virou até mesmo uma trend nas redes sociais, principalmente no Instagram. Por não encontrar informações sobre a origem do projeto, fica apenas a foto. Confesso que não tive coragem de ir até o topo, afinal, Deus, tá cedo ainda para te encontrar, não acha?
E aí, tem o deslumbrante Clay Tunnel…
O Clay Tunnel é uma construção artificial e muito famosa na cidade de Da Lat e o espaço conta com diversas estruturas de argila e vários trabalhos de arte – túnel aberto – Estou fazendo essa observação, porque ao mesmo tempo que estava maravilhada com as obras, continuava à procura do túnel, mas somente depois de andar em círculos, percebi que estava dentro dele há horas.
Confesso que fui atraída somente pela foto de duas estatuas belíssimas no meio de um lago, que havia visto no Instagram e achava que seria somente aquilo, mas chegando lá encontrei um parque fabuloso e muito grande.
Descobri que tudo começou em 2010, quando foram construídas duas casas de argila. Depois desse sucesso, o dono do projeto, Trinh Ba Dung, deu continuidade às construções.
Ele construiu um túnel de 2km que conta as histórias da cidade de Da Lat em dois períodos, um que é de antes de 1893 e um que começa a partir de 1893. As construções remetem a estações de trem, animais selvagens, lendas, monumentos culturais e uma arquitetura única.
É um tipo de atração tão única e diferente que foi reconhecida pelo Livro de Recordes do Vietnã como a primeira casa de tijolos vermelhos “crua” e com estilo diferente. Vídeo aqui
Ela é considerada crua por não ter sido feita de tijolos propriamente ditos, ela na verdade é feita de argila e de uma mistura especial que endurece e não precisa ser levada para altas temperaturas. Simplesmente, fantástico!
Eu poderia escrever aqui por horas e detalhar tudo, mas resumindo, a minha conclusão ao final é: se você é um viajante, o Vietnã é um ótimo lugar para começar ou para ser a sua próxima parada e não se limitar a conhecer apenas aos pontos turísticos mais indicados por influenciadores.
Eu fiquei longe de Hanoi ou Ho Chi Minh – as cidades mais visitadas – no meio do nada cercada de montanhas de cafezal e arroz e no meio desse nada eu conhecei lugares, pessoas incríveis, de uma generosidade e calor humano, que dá aquele quentinho no coração sempre que eu me lembro.
E muito mais do que apenas esses três pontos turísticos que eu comentei, você pode conhecer toda uma cultura e diversos monumentos nesse país, a qual eu estou apaixonada.
Vietnã, estaremos juntos muito em breve.
Com todo o meu amor.